quinta-feira, 7 de maio de 2009

A Lenda da Amizade



Havia um país onde existiam, há muitos anos, pessoas que se conheciam apenas superficialmente. Todos os dias se encontravam, tratavam de seus interesses e prosseguiam, agindo sempre de maneira mecânica e estudada, e assim se entendiam e atendiam as expectativas uns dos outros.
Chegou naquela cidade um dia um velho senhor, de longos cabelos brancos, corpo esguio e sorriso nos olhos. Ele sentou-se no meio da praça para descansar um pouco da jornada que estava realizando por aquelas bandas. Uma senhora que caminhava por ali com uma grande cesta de frutas, não viu um pequeno declive no passeio da praça e acabou perdendo o equilíbrio e caindo no jardim. Com a queda, as frutas se espalharam por todos os lados e ali ela ficou por alguns instantes, imóvel, desnorteada, triste com o que acabara de lhe ocorrer...
Uma mão envelhecida pelo tempo, mas firme ainda o suficiente para ergue-la do chão, trouxe aquela mulher de volta para a realidade. Aceitou a ajuda daquele velho sem entender direito o que estava se passando e foi invadida por grande espanto quando ele calmamente começou a juntar suas frutas e recoloca-las na cesta.
Aquilo não fazia o menor sentido para ela. Primeiro se surpreendeu, depois desconfiou, até que finalmente julgou que se o velho estava juntando aquelas frutas era por que estava pretendendo levar com ele, toda a colheita que ela estivera fazendo, durante uma manhã inteira de trabalho. Estava já pensando em protestar, quando ele voltou em sua direção com a cesta novamente cheia e depois de um sorriso transparente de felicidade, entregou em suas mãos o fruto de seu trabalho. Depois o velho voltou a se acomodar no meio da praça, no banco que chamavam de florido, pois entre as tiras de madeira das quais era feito, teimava em se expandir um tipo diferente de planta, colorida e vistosa.
O comportamento do velho deixara aquela mulher confusa. Por que ele tinha colhido as frutas para ela, se não queria furtar-lhe o trabalho ou comprar-lhe o produto? Por que também a tinha ajudado quando caíra, levantando de onde estava para estender-lhe a mão? Aquela simples experiência, na praça, com um desconhecido ancião, estava transformando alguma coisa dentro dela. Ela podia sentir que as expectativas que tinha sobre as atitudes dos outros e de si mesma estavam se modificando. Ela então sorriu. Voltou correndo para a praça mas não encontro mais o velho por ali. Havia apenas uma linda flor, brotando da trepadeira do banco. A mulher então sentiu cair uma lágrima de seus olhos, e entendeu que apesar de não conhecer aquele senhor e de sequer ter trocado com ele uma palavra, havia um enorme vínculo de gratidão, carinho e respeito entre eles. Ele havia transformado sua vida para sempre, fazendo ela crescer, e por isso estaria presente sempre em seu coração e em sua mente.
Daquele dia em diante a mulher revolucionou a vida da cidade onde vivia. Começou a ajudar os outros, cativando as pessoas e estabelecendo com elas profundos elos de reciprocidade no carinho e na alegria de conviver. Todos queriam experimentar aquele sentimento novo, a magia que aquela mulher irradiava estava transformando tudo. As pessoas se ajudavam nas ruas, se sorriam e se abraçavam. Estavam aprendendo a celebrar momentos felizes de convívio e a guardar no coração essas lembranças.
A mulher então percebeu que aquele clima de felicidade completa não poderia durar para sempre e entendeu qual era o risco daquela nova forma de sentir o outro. Era o risco da expectativa. Quando as pessoas descobrem o poder que tem de se fazer bem, geram e esperam atos de doação e generosidade dos outros ! Aquelas pessoas haviam aprendido a ter expectativas e a primeira expectativa não correspondida, com certeza quebraria aquele elo de ligação tão intenso. Então ela chorou... Porque tinha que ser assim ? Por que tudo na vida tinha que obedecer aquele ciclo, de começo meio e fim ? Ela então se questionou e se amargurou com essas coisas e estava perdendo o melhor da festa por só pensar que ela teria que acabar...
Mais uma vez o velho apareceu. Vinha caminhando lentamente por uma das estradas que dava acesso àquela vila. Seu rosto parecia mudado, ele estava muito sério e já não trazia nos olhos aquele sorriso aberto. Isso mexeu com o coração da mulher...
Ele então a olhou no fundo dos olhos e perguntou com voz doce e compassada:
- Por que traz esse peso na alma ?
Ela então respondeu:
- Porque tudo isso vai se acabar ...
Ele sorriu e, afastando-se, falou:
- As coisas essenciais nunca terminam ! Vivem, morrem e renascem com cada um de nós ! Elos forjados pelo amor e pela boa vontade entre as pessoas jamais se partem, jamais se quebram... Aquieta seu coração... A verdadeira amizade gera expectativas mas compreende deslizes; busca igualdade de afeto, mas perdoa o esquecimento; deseja sempre a presença, mas ignora a distância. Nada perturbe seu coração. Agora você está cercada de amigos... Celebre, comemore, a vida vale a pena por essas coisas... Cada amigo que você faz é um capítulo escrito na história de sua vida ! Uma amizade verdadeira só nasce, envolvida por grandes gestos, nobres sentimentos e uma profunda intenção de que aquilo seja eterno....
A mulher então entendeu...e dessa vez sorriu, sorriu muito... E o seu sorriso doce e manso contagiou ainda mais as pessoas daquele lugar... A noite então pareceu estar mais iluminada e os corações mais aquecidos...
Naquele lugar existia uma enorme expectativa: A esperança da boa vontade entre as pessoas. E esse já era um grande passo para a harmonia pousar por ali por muitos e muitos anos!

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