domingo, 11 de outubro de 2015

Conversas de Táxi



Esses incríveis e anônimos condutores, dos veículos mais inusitados e personalizados existentes na face das ruas, costumam nos brindar com alguns diálogos dignos das mentes mais privilegiadas dos mais brilhantes dramaturgos produzidos pela humanidade.

Dia desses, debaixo de um sol de meio dia, num daqueles dias de verão em pleno outono, entrei num destes táxis de rua e, depois de uma correspondida saudação de boa tarde, coisa rara por estas bandas, indiquei nosso destino e, enquanto me esforçava para exercer com a maior dignidade possível o obrigatório ritual de encaixar o cinto de segurança, fui abordado, sem maiores cerimônias, com a seguinte indagação:

-"O Sr. prefere com ar ou sem ar?"

Surpreso com a pergunta, respondi sem pensar, já acostumado com este vício urbano contemporâneo:

-"Eu prefiro com ar, mas e o senhor, como prefere?"

Mais surpreso fiquei com o discurso que se seguiu:

_"Pra mim tanto faz, sr. Quem manda no meu táxi é o passageiro. Eu me adapto. Pra mim está sempre tudo bom. Eu perguntei porque tem gente que não gosta de vir deste sol quente e receber o bafo gelado do aparelho nos peitos. Pega logo uma constipação, veja o Senhor. Eu, graças a Deus não sei o que é isso. Não lembro a última vez que peguei uma gripe. Mas como eu dizia, pra mim tanto faz. Eu seguro o calor dos infernos do meio dia num engarrafamento do cão e o ar condicionado no volume máximo, da mesma forma. Tô sempre de boa. Tenho 35 anos de táxi e não sei o que é dor de
coluna. Eu acho que eu nem tenho coluna. Não sinto nada."

-"Que bom", respondi."Dor de cabeça, então, não deve nem saber o que é!"

-"Mas não mesmo! Quem parece que vive com enxaqueca é a presidenta. A mulher tá mais confusa que tatu correndo de menino. Não sabe pra onde vai. E não fala coisa com coisa.Eu hein?! Quem tá trabalhando é o cabeção. O que não tem de altura tem de cabeça. Não sei onde tá arranjando dinheiro pra tanta obra, o anão. Mas ninguém pode dizer que ele não trabalha. Deve ser coisa de anão
mesmo, o senhor veja, os anões da branca de neve faziam o que? Trabalhavam, trabalhavam, trabalhavam e depois iam pra casa pra voltar a trabalhar no outro dia. O Miseraviu parece que vive pra trabalhar. Mas disse que é pegador, o tampa de binga. Faz sucesso com o mulheril... Ele devia dar um trato na mulher do planalto... Quem sabe ela organizava as idéias..."

Sem saber muito bem como controlar o riso, ia me divertindo durante o caminho, enquanto aquele fantástico personagem ia partilhando comigo suas opiniões sobre os assuntos mais diversos, que pareciam estar conectados na sua cabeça, através dos links mais improváveis.

Do ar para a política, da política para as mulheres, das mulheres pro futebol, do futebol pro trânsito, a criatura ia trançando uma espécie de croché da informação, envolvendo seus passageiros com seu simpático, elucidativo e genial lenga-lenga. Quando chegamos ao destino fiquei tentado a perguntar quanto era o couvert artístico. Achei melhor me conter. Ia dar muito pano pra manga e va saber onde essa nova conversa podia parar...

Ao sair do táxi, percebi que o grande condutor seguia falando... Devia ser um passageiro imaginário. Ou então, com o conhecimento que possui, era capaz que estivesse falando pelo celular com o anão cabeçudo ou com a mulher do planalto. Nunca se sabe..

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