quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Três Gerações Vieirenses (Crônica para o Livro Ex-Alunos 2 do Colêgio Antônio Vieira)



Filho de pais baianos (Pai Vieirense), mas nascido em Brasília-DF devido à trajetória profissional de meus pais, cheguei de mudança a Salvador em 1974, aos 7 anos de idade. Até então minha experiência escolar se resumia ao jardim de infância e à 1ª série em escolas públicas da Capital Federal.

Ao chegar em Salvador, ainda em período de férias, fomos morar, eu e minha irmã mais velha, Luciana, na casa de uma das irmãs de minha mãe, Tia Léo, casada com Tio Eduardo e cujos filhos estudavam no Vieira, desde sempre uma referência educacional em minha memória. Por causa dos trâmites da transferência de meu pai, ele e minha mãe só viriam para Salvador três meses depois. Eu era uma criança que, até então, só havia morado com minha família em um apartamento, numa cidade toda planejada como Brasília e que, de repente, estava pela primeira vez longe dos pais, morando numa casa em Nazaré, numa cidade onde tudo me parecia muito estranho. O sotaque, a culinária, os hábitos e costumes, tudo aqui era muito pouco familiar para mim. Na primeira vez que cheguei na casa de minha avó materna, por exemplo, me senti um verdadeiro estrangeiro quando ela me disse para ir “arear o dente” no “quarto sanitário” antes da “ceia”. Eu, que costumava “escovar os dentes no banheiro antes da janta”, literalmente fiquei sem saber pra onde ir e o que fazer. Neste período de ambientação soteropolitana, alguns episódios hilários: Certo dia, estávamos assistindo TV na sala quando a mãe de Tio Eduardo, saiu do seu oratório com um turíbulo na mão para incensar a casa. Era a primeira vez que eu presenciava este tradicional ritual baiano. Quase saí correndo quando ela veio em nossa direção. O mico só não foi maior por causa de minha irmã, que segurou minha mão e me explicou que ela só estava rezando.

Chegou a época da matrícula nas escolas. Eu e minha irmã iríamos tentar vagas no Vieira. Minha primeira impressão do colégio não foi das melhores. Era imenso para meus padrões e a quantidade e diversidade de alunos de várias idades me assustou. Eu tinha acabado de concluir a 1ª série fundamental e fui fazer teste para a 2ª. Por causa da diferença fonética à época (LÊ, MÊ, NÊ, RÊ, SI, etc) e por outras diferenças na grade curricular, família e colégio acharam por bem que eu fosse matriculado na 1ª série daqui, para facilitar minha adaptação. Foi difícil me convencer de que eles não estavam me fazendo repetir de ano, mas no final (criança naquela época não apitava mesmo) cedi e aceitei aquilo como o melhor para mim.  Assim, em março de 1975, eu entrava pela primeira vez no CAV como aluno, colégio onde fiquei até 1986, no 3º ano do ensino médio.

Do Vieirinha guardo recordações fabulosas de alguns personagens inesquecíveis. Pe. Gino, Pró Lenice de Religião, Pró Márcia do SOE, Pró Graça que descobriu a minha enorme miopia na terceira série (já tinha 7 graus e não sabia). Gente que me acolheu com muita sensibilidade e compreensão. No período do Vieirinha, a presença de minha família na comunidade Vieirense foi muito importante. Logo que regressaram a Salvador meus pais foram escolhidos para presidir a APM, nos tempos em que o colégio era dirigido por Pe. Dionísio e por Pe. Bertoli. Nesta época, meu pai se transformou em técnico de futebol do time da minha sala, tudo para que o “brasiliense perna de pau” fosse se adaptando ao gosto futebolístico de Salvador. Por causa desta sua atitude, quando cheguei ao Vieirão já estava entre os primeiros na escolha dos times dos inesquecíveis e saudosos “babas” do campão. Cinco outros registros importantes da época: a estranheza que sentia ao chamar as professoras de “Pró” e não de “Tia”; a alegria que senti na minha 1ª Comunhão tão bem preparada por Pró Lenice; o orgulho de receber o Diploma de Honra ao Mérito que o CAV oferecia aos que passavam direto; as primeiras amizades que fiz em Salvador, algumas presentes e importantes em minha vida até hoje; as orações diárias de Padre Gino antes das aulas. Aqui cabe outro “causo”: Havia uma palavra que sempre estava presente no momento da reza em frente à Diretoria do Vieirinha. Um dia, rezando em casa com minha mãe, pedi a ela para rezar aquela oração que Pe. Gino sempre nos pedia para rezar: “Bozarta”. Lógico que ela não sabia do que se tratava, mas me disse que iria se informar a respeito. Certo dia, depois de assistir a oração do estacionamento, ela me esclareceu: “Rezar Bozarta” nada mais era que Padre Gino pedindo a cada um de nós para “rezar em voz alta”, com seu pesado sotaque italiano, que misturava as palavras. Anos de gozação lá em casa, meus irmãos até hoje quando lembram me chamam de “Bozarta”.

Do Vieirinha para o Vieirão, grandes mudanças. Um novo período de adaptação. De repente deixávamos de ser os “porretões” da 4ª série no Vieirinha, para ser os “pixotes” da 5ª série do Vieirão, identificados e controlados por uma caderneta que era carimbada todo dia. Tempos de mais responsabilidades, mais matérias, novas turmas, amizades e aprendizados. Do dito ginásio (5ª a 8ª série, sempre turma D) algumas lembranças: Professor Jair e o hino Brasileiro nas Quintas feiras. As aulas de Educação física com Cavalcante, Ivan, Augusto e Jackson, às 6:30 da manhã. O bosque exalando ar fresco e puro. A doçura de Tia Carmem. Os fiscais “empata-baba” Lopes, Telles, Waldir, Balbino, Renato e Moacir. Irmão Pedro e Herculano nos esportes. O inglês de Carmélia e Waldemar. Romero e as Ciências. A pequena grande Gracinha no português. Dirce na matemática. Joanice em geografia. O vozerão de Gregório. A rivalidade com o FUNCAV. E colegas que se tornaram amigos de uma vida inteira. Desta época, uma lembrança inesquecível para quem esteve lá: Para ganhar a Gincana, se não me engano na 6ª ou 7ª série, na última tarefa, de originalidade, a nossa “TURMA D” invadiu o Vieira com o Elefante de um Circo do estacionamento de S. Raimundo. Apoteose no Telheiro! Neste período, a própria vida também educava e formava o adulto que eu viria a ser. No início de 1981, iniciando a 7ª série, meu pai teve um AVC fulminante e faleceu. Nova readaptação. E o Vieira foi muito importante para superar aquele momento, através do grupo de jovens de Pe. João Batista, dos dias de formação no Sítio Loyola, da prática esportiva e do Encontro do OPA, no Sítio São José em Mar Grande. Essenciais para o crescimento de minha fé e meu amadurecimento pessoal.

2ª grau. Anos de descobertas e experiências. Amizades, namoros, preparação para o Vestibular! Como não lembrar do sentimento de liberdade de poder sair do colégio no intervalo, para lanchar a inesquecível meia vara mista da padaria Fátima, os salgadinhos do Andrew´s, saborear a pipoca de “Bahia” ou as coxinhas de “Carlinhos”? Nesta época, verdadeiros mestres que, muito além da matéria que lecionavam, nos ensinavam com profundidade sobre a vida: Zé Carlos, Walter, Miranda, Mª do Carmo, apenas para citar alguns. Tempo de aprendizados, enfrentamentos, manifestações, trocas, crescimento! E um grande sentimento de nostalgia e saudade no último ano como aluno do Vieira no já distante ano de 1986.

Já em 2005, publicitário, casado, minha filha Letícia, saindo da pré-escola, após percorrer alguns colégios de Salvador, escolheu o Vieira para estudar. Novo aprendizado, desta vez como pai. De 2005 a 2015 o Vieira também foi sua segunda casa e a ajudou muito em sua formação humana, espiritual e profissional. Novas amizades feitas com pais de seus colegas e velhos amigos reencontrados. Destaco aqui a alegria de ver, anos depois, Lenice, minha antiga professora de religião como Diretora do CAV e Renato, fiscal na minha época, como Diretor do Vieirinha.

Gratidão e respeito a esta instituição e às pessoas que a fizeram nestes seus mais de cem anos de existência. Muito feliz em participar desta publicação e poder testemunhar o quanto a “Família Vieirense” é grande e forte em nossa cidade e, em particular, em nossa família, com três gerações de vieirenses formadas em seus inesquecíveis corredores. Vida longa ao Vieira!


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