Por ele não existiriam festas. Ainda mais de aniversário. Coisa
que detestava aquela reunião (quase sempre forçada) de pessoas das mais
diversas tribos reunidas num só espaço pela obrigação de cantar os parabéns e
levar uma lembrancinha para fulano ou fulana. Costumava dizer que aquilo se
assemelhava ao mais primitivo ritual de bandos Neandertais em volta de uma
fogueira ou de uma caça recém obtida.
Decididamente ele era contra festas deste tipo e, na
grande maioria das vezes, simplesmente não comparecia. Geralmente uma delicada
e cuidadosa desculpa antecipava a sua ausência. Só quando não tinha mesmo
jeito, se via obrigado a encarnar o convidado feliz e assim o fazia, muito mais
por consideração e respeito ao outro do que por sua vontade de
estar ali e presenciar aquilo tudo.
E assim ia convivendo com seus conhecidos, das mais diversas
esferas, driblando convites profissionais aqui, fugindo de outros familiares ali,
saindo pela tangente mais adiante em eventos de alguns amigos, correndo léguas de
multidões de mais de meia dúzia de pessoas, encarnando, enfim, o mais absoluto
e assumido ser anti-social do seu meio.
Às vezes era indagado por alguém mais próximo sobre a
intensidade e o despropósito de tamanha ojeriza, ao que sempre respondia: “não
espero que me entenda, mas que me respeite a opinião!”
E esta situação era ainda mais agravada quando o aniversário
em questão era o dele mesmo. Aí, qualquer alusão ao tema, nas proximidades
daquela data, era como provocar um enxame de abelhas africanas. Melhor sair de
baixo!
E eis que algumas vezes, motivados talvez pela curiosidade
diante do desconhecido, talvez pelo desafio frente ao temor, mas com certeza
sempre com a melhor das intenções, não é que alguns de seus amigos, colegas ou
conhecidos tentaram promover festas surpresas para aquela criatura?
Pense num desastre! Relações estremecidas, decepções
estampadas, comidas e bebidas desperdiçadas, convidados horrorizados, comissões
organizadoras estupefatas com as reações mais absurdas e grotescas do
homenageado. Na maioria delas a ausência foi a presença mais marcante das “celebrações”.
Na única que o pegaram de jeito, sem chance de uma fuga cinematográfica por
portas do fundo ou escadarias de serviço ou incêndio, um a um os convidados e
organizadores iam percebendo a “bola fora” que tinham dado, diante de um
aniversariante gélido, sério, contrariado e, a cada segundo, mais insuportável
na acidez e ironia de seus comentários monossilábicos. Resultado? Esvaziamento
total do evento e de alguns relacionamentos.
Depois dessas, todos os que o conheciam ao menos um pouco não
se atreviam mais sequer a mencionar seu natalício. E ele, feliz, diante de uma
ou outra provocação ou pergunta sobre o assunto, respondia que até sua própria
família não lhe dava mais os parabéns.Nunca mais soube de outro episódio neste sentido. Pode ser
até que andem pensando em interná-lo, não me espantaria. A transformação da sua
personalidade diante daquele assunto, passando de cidadão pacato e tranqüilo à
uma mistura grotesca entre Dr. Jekill e o incrível Hulk, trazia à tona a “fera
interior” naquela pessoa.
Por não “freqüentar” estes ambientes não poderia encontrá-lo,
a não ser numa destas raríssimas exceções das quais ele não tem como fugir. Mas,
de um tempo pra cá, talvez desde o dia em que nasci, não sei bem ao certo, cada
vez mais me identifico com o nosso personagem. Por que será? Melhor não
perguntar... Como diria um certo Dr. David Benner: “Vocês não gostariam de me
ver nervoso!" Huaaaaaaaaaaahahaahahahahahaahaahaaaaaa.....
Ave Maria! De uma parte eu já sabia e tenho dispensado meus parabéns há uns bons 5 anos, ou mais... Mas da outra não sabia não.
ResponderExcluirEm sendo assim, deixo aqui registrado, desde já, que - se é um sacrifício tão grande e horrível comparecer aos aniversários dos outros - você está dispensado das minhas próximas (e com fé em Deus muitas!) comemorações...
Parei de dar os parabéns porque não vejo sentido em fazer algo contra a vontade de alguém e sempre penso no que gostaria que fizessem comigo. No meu caso, justamente o oposto... Pensava "o que eu sentiria se todos deixassem de me dar parabéns?", e tentei dimensionar e comparar a tristeza que eu sentiria com a tristeza que vc, provavelmente, sente ao recebe-los, parei de dar, sem culpa ou peso na consciência, pelo contrário: pensando que estava fazendo um bem a você!
Mas achava que a recíproca era verdadeira. Vc celebrando e comemorando com aqueles que gostam, vibram e contam os dias para o aniversário (como eu!), estava pensando na alegria que você sente, quando ninguém lembra ou celebra a data do seu.
Mas já que estava enganada e já que o trecho "quando não tinha mesmo jeito, se via obrigado a encarnar o convidado feliz e assim o fazia, muito mais por consideração e respeito ao outro do que por sua vontade de estar ali e presenciar aquilo tudo", deve ter se aplicado a mim e ao meu caso umas 22 vezes (porque só lembro de não ter comemorado uma vez! hehehe). Fica aqui a dispensa da presença nos próximos...
A princípio posso ficar triste e sentir muito a sua falta, aliás, com certeza isso acontecerá. Mas se seus bons desejos e boas vibrações forem mais intensas e sinceras "de longe", fique à vontade. O que importa é que elas existam e eu sei que de sua parte existe e sempre existiu! Só não quero - e nunca quis - que se misturem a uma sensação de obrigação e chatice! hehehe Acho que o sentido de se comemorar um aniversário é justamente celebrar mais um ano de vida que passou e outro que começa com pessoas que se sentem feliz por essa data. E não com pessoas que encaram aquilo como uma obrigação, que não tem jeito de faltar! Acho que nessa vida, a única obrigação que temos que ter é com nossa felicidade! :) Sejamos, pois, felizes e sinceros! Com ou sem celebrações e sem encarnações de convidados felizes, quando na verdade se está uma fera! hehehe
beijos
Orgulho retado de dindo! Por estas e outras voce é sempre citada como exemplo de respeito ao outro, quando trazem este "palpitante tema" à tona. Meu obrigado eterno ao seu respeito e silenioso bem querer! Obrigado também pela dispensa, embora no seu caso a "obrigação" tenha sido sempre acompanhada de partilha de sua felicidade. É a velha história, respeito tem mão dupla, mesmo que a gente não concorde ou até não compreenda o outro. mas o importante mesmo, no silêncio ou na ausência, é saber do bem querer todos os dias e não em um só! Show! Adorei confirmar que já se encontra num patamar altamente evoluído de compreensão, sensibilidade e desapego!
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