quarta-feira, 7 de julho de 2010

Porque escrever me faz livre...



Livre pra escrever o que me der na telha. Falar das tardes vermelhas que achei nos esquadros das minhas janelas. Falar das noites laranjas, urbanas sentinelas acesas, nas madrugadas em vigília que passei sem sono, simplesmente no abandono de um poema que não veio.
Livre para falar sem voz, criando nós entre as palavras que escrevo, nas frases soltas que me atrevo a dedilhar aqui... Escrever sobre a inquietude de um tempo e o sonho de dar algum exemplo ao existir...
Livre para não me prender aos alheios, fartos seios das críticas e maldizeres... Livre pra caminhar entre as letras, sem muito preparo ou receita, apenas fluindo, me deixando esvair nas conjecturas que, generosamente, vêm até mim...
Livre para plantar alguma rima, alguma oração diferente, praticando, diariamente, esgrima verbal com tanta gente.
Livre pra ser estranho, não aceitar o amém obrigado, demorar no banho, sonhar com alguém que está do outro lado, muito além...
Livre pra não me achar rebanho e, ainda assim, saber ser também um pouco gado, sem dimensões de tempo ou tamanho, saber dizer “obrigado”, me alegrar em oferecer um “bom dia”, ou será fantasia esperar um “por favor”? “Com licença”, caducou?
Livre para ser quem eu sou: um Quixote Urbano, romântico insano, à procura de velhos ventos que destilem em meus moinhos, a força dos sentimentos, o escudo dos ninhos, o uivo dos valores que dão cores aos meus dias, que me fazem seguir...
Livre para descuidar da métrica, para questionar a pátria, pra contradizer a prática de toda relação assimétrica...
Livre para voar sem rumo, para buscar o prumo entre nuvens e estrelas, e degustar o sumo das pessoas só em vê-las, tão preocupadas com suas vestes e suas máscaras rituais...
Livre pra ficar em paz...
Para acordar para a morte sem pensar na vida. Para não querer a sorte da viagem só de ida. Para recusar a fortuna, a fama, o sucesso.
Livre para aceitar o processo, para curtir a paisagem, em grupo ou só...
Livre pra ser pó...
Pra me fazer partícula, me dividir, não ser denso, ser retícula, ser incenso sem fedor...
Livre pra estar de partida...
Saber que o amanhã pode não estar presente no encontro marcado com a rotina...
Livre para estar livre com quem está enclausurado, distante dos seus jardins...
No meu peito baldio, um menino livre brinca no quintal...
Atire a primeira pedra, quem encontrar algum mal...

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