domingo, 13 de setembro de 2020

Coisas da irmã Doçura



A Irmã Doçura estava na Capela rezando numa noite de lua e chuva....
pensava na família que havia visto num Jardim em Nazaré.
Eles pareciam passar fome e frio...
E seu coração tinha arrepios ao ver irmãos com qualquer tipo de dor...
A Irmã Doçura era movida pelo Amor!
Agora, ali na Capela, na simplicidade do seu servir franciscano, ela pensava em quantas portas haviam se fechado para aquela família...E uma espécie de nostalgia ecoava em sua alma...
Em tempos de pandemia seu coração intuía que aquela família representava a pobreza de tantas famílias que estavam peregrinando, naquele momento, pelos terrenos baldios e becos escuros dos seus interiores mais solitários e sombrios...
Aquele era o Natal do vazio...
o Natal do estio...
do jejum forçado do abraço, da Vida ausente, do presépio indigente, da saudade enclausurada...
Extasiada pela transfiguração reluzente de sua peregrinação solidária, na jornada orante e solitária de sua oração, a Irmã Doçura ofereceu a si mesma o banquete da sua impotência diante daquela situação...
A angústia arranhando seu coração...
A falta de oportunidade de ação como penitência....
o eco de tanta indiferença latejando como um mantra, uma admoestação...
É...você não pode mudar o mundo, costumava escutar...
Estamos todos de passagem montando presépios interiores, oferecendo confortáveis manjedouras aos nossos próprios lamentos...aos nossos frágeis sentimentos...
Naquele instante a Irmã Doçura pôde  sentir o travo amargo da inquietação na degustação daquela miragem...
No espelho de seu deserto, a contemplação da madrugada da ausência  em sua jornada...
Sua Belém abandonada na matança dos inocentes...
Na contemplação de tantas casas reviradas ao avesso, o Amor continua em busca de morada...
Há algum lar com portas abertas ao sacrifício?
Há algum lar capaz de abrigar o Amor como ofício?
Saindo da capela em direção a um dos seus, exercendo o sacerdócio do abraço, a Irmã Doçura acolhia a Deus em cada um dos seus passos...

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